OS POVOS IND�GENAS E A SOCIEDADE DA INFORMA��O NA AM�RICA LATINA E O CARIBE: um marco para a��o

Isabel Hern�ndez Silvia Calcagno

Funcion�rias da Divis�o de Popula��o (CELADE, Centro Latino-americano e Caribenho de Demografia) da CEPAL, Na��es Unidas.[1] Projeto con Instituto para a Conectividade nas Am�ricas (ICA). �[2]

 

A Am�rica Latina alberga quatrocentos povos ind�genas, cerca de 50 milh�es de indiv�duos; a maioria sofre discrimina��es por sua perten�a �tnico-cultural e sobrevive em condi��es de marginalidade que contrastam com o mundo moderno que a rodeia. Sua exclus�o econ�mica se baseia em discrimina��es gerais, similares �s registradas pelas camadas pauperizadas do campo e da cidade; mas sua margina��o se aprofunda devido � intoler�ncia e � discrimina��o �tnico-cultural, presentes nas sociedades nacionais da regi�o.

O paradigma de globaliza��o econ�mica est� agudizando os processos hist�ricos de margina��o social dos povos ind�genas, enquanto no plano cultural se propicia um processo de �homogeneiza��o� que tenta socavar a identidade pluricultural do continente, desconhecendo que a constru��o de uma cidadania moderna traz consigo o desafio de conciliar as particularidades hist�rico-culturais de cada povo com a voca��o universalista do desenvolvimento e a modernidade.

N�o obstante, as causas do recrudecimiento da exclus�o ind�gena e sua atual margina��o da sociedade inform�tica n�o s�o atribu�veis, exclusivamente, �s rela��es de desigualdade geradas entre o centro e a periferia. Al�m delas, � preciso focalizar a an�lise na din�mica interna destas sociedades e suas lideran�as, nas rela��es de g�nero y nos processos migrat�rios que definem diferen�as entre grupos e indiv�duos ind�genas no que diz respeito ao n�vel educativo, n�vel de consci�ncia �tnica e sentido de pertin�ncia, possibilidades de inser��o em atividades n�o tradicionais e na aceita��o ou rejei��o dos meios digitais de informa��o e comunica��o. Em alguns casos, intelectuais, dirigentes e organiza��es ind�genas t�m visto nas TICs uma valiosa oportunidade para irem al�m do n�vel local e atingirem presen�a regional, nacional e internacional. Em forma r�pida e eficiente, apropriaram-se da tecnologia digital, na qual reconhecem potencialidades para fortalecerem seus processos pol�tico-organizativos, de comunica��o, revitaliza��o ling��stica e cultural. Paralelamente, outros setores ind�genas erguem vozes que denunciam as TICs como uma nova forma de inger�ncia da sociedade nacional, que procura somar as comunidades ao consumo inform�tico pautado por interesses alien�genas.

Para potenciar a inclus�o ind�gena na sociedade da informa��o, � preciso avan�ar na defini��o de propostas de inova��o e pol�ticas sociais de car�ter reparador ou complementar, que fortale�am as tentativas ind�genas de superar o desaf�o da margina��o inform�tica. As estrat�gias neste campo surgem nos povos origin�rios que atingiram maiores n�veis de coes�o comunit�ria e de representa��o, direta e leg�tima, em organiza��es de segundo e terceiro grau. A sociedade pol�tica e a sociedade civil n�o-ind�gena, em alguns casos, come�am a apoiar estes processos, geralmente de n�vel local. Contudo, em mat�ria de pol�ticas p�blicas, n�o foi atingido o consenso necess�rio para se atuar em forma integral e coordenada, tentando reunir os esfor�os governamentais, da comunidade internacional e das parcerias da sociedade civil, a fim de impulsar a denominada �oportunidade digital�.

Esta Oficina Virtual sobre Inclus�o Ind�gena nas TICs � um espa�o prop�cio para aprofundar o debate conceitual e contribuir para a elabora��o de um marco para a a��o que facilite o acesso ind�gena �s TICs, enquanto ve�culo de transforma��o social. A Oficina Virtual � uma janela aberta que soma propostas para uma a��o integrada desde a maior diversidade de crit�rios, experi�ncias e perspectivas culturais.

Desafios

Oportunidades

Propostas

* Preconceitos culturais das ag�ncias de governo, ONGs e amplos setores das sociedades nacionais. *

* Altos n�veis de desconfian�a dentro das comunidades ind�genas com rela��o ao poss�vel impacto perturbador das TICs nas pautas culturais e sociais.

* Desfasagem da concep��o cultural de tempo e espa�o entre a sociedade ind�gena e a sociedade global. *

* Baixos n�veis de alfabetismo e de alfabetiza��o inform�tica ind�gena.

* Processos intra-comunit�rios que dificultam a apropria��o das TICs.

* Altos �ndices de desemprego; base econ�mica ind�gena fraca.

* Velocidade nas mudan�as tecnol�gicas, que dificultam os

Experi�ncia hist�rica dos povos ind�genas na apropria��o, com �xito, de bens culturais da sociedade global.

* Ascens�o do movimento �tnico em n�vel continental.

* Presen�a de novo tipo de lideran�as.

Surgimento de organiza��es de segundo e terceiro grau.

*Maior reconhecimento da sociedade global do rol desempenhado pelos povos ind�genas na sustentabilidade do desenvolvimento.

* Aumento da sensibilidade social internacional para com a situa��o e as demandas ind�genas.

*Experi�ncias de auto-gest�o econ�mica, pol�tica, cultural e inform�tica ind�gena.

* Diminui��o dos n�veis de preconceito e discrimina��o nas sociedades nacionais, por meio de a��es comunicacionais

espec�ficas.

* Promo��o de atitudes favor�veis �s TICs na popula��o e nos dirigentes ind�genas.

* Implementa��o de programas espec�ficos de acesso (de curto, m�dio e longo prazos), projetados partindo de diagn�sticos integrais realizados com a participa��o ativa das comunidades ind�genas e respeitosos de suas estruturas sociais, culturais e econ�micas.

* Articula��o com programas econ�micos, sociais e culturais de longo prazo que contemplem investimento estrat�gico para presta��o de servi�os b�sicos (ltiiddtlfid�)

 

 

processos de tomada de decis�o comunit�ria.

* Elevados custos da infra-estrutura tecnol�gica, associados ao isolamento geogr�fico e � car�ncia de servi�os de infra-estructura b�sica.

* Altos n�veis de obsolesc�ncia tecnol�gica.

* Aus�ncia de marcos legais que facilitem o acesso a linhas de cr�dito e/ou financiamento de programas tecnol�gicos.

* Expans�o das TICs orientada segundo a l�gica de mercado.

* Concentra��o da produ��o de hardware e software num pequeno n�cleo de pa�ses industrializados. *

* Predom�nio da l�ngua inglesa no campo tecnol�gico.

* Crescente aumento do nivel educativo da popula��o, particularmente entre os migrantes, que gera a presen�a de um n�mero significativo de profissionais ind�genas.

* Maior abertura � incorpora��o do enfoque de eq�idade de g�nero.

*Experi�ncia social acumulada a partir da apropria��o efetiva das TICs pelas pessoas e organiza��es que gestionam estrat�gias comunicacionais e inform�ticas em forma aut�noma.

*Capacidade instalada em recursos t�cnicos e humanos.

Experi�ncias realizadas de inclus�o eletr�nica por meio do modelo de acesso compartilhado (telecentros).

*Aumento do capital social das comunidades.

*Aumento da incorpora��o tecnol�gica para alfabetiza��o inform�tica na educa��o b�sica.

(eletricidade, telefonia, educa��o) e promovam a organiza��o auton�mica dos povos ind�genas.

* Regula��o jur�dica da participa��o do setor privado em tais programas e apoio do setor p�blico quando o mercado e sua din�mica particular n�o puderem contribuir com solu��es efetivas para combater a desigualdade social.

* Implementa��o de programas de longo prazo que permitam a explora��o intra-comunit�ria para decidir de que forma as TICs ser�o incorporadas, aceitando a premissa de que as comunidades ind�genas podem decidir n�o utiliz�-las da mesma maneira que outros grupos das sociedades nacionais.

 

Programa espec�fico de acesso ind�gena �s TICs

Sublinhando que o design do programa surgir� de diagn�sticos integrais realizados com a participa��o ativa dos povos origin�rios, esbo�amos a seguir alguns dos pontos centrais a serem contemplados por um Programa de acesso ind�gena �s TICs, vinculado com as demandas das comunidades (direitos civis e humanos, governo municipal eletr�nico, resguardo do meio-ambiente, produ��o, educa��o auton�mica biling�e e intercultural, sa�de integral, etc.) e coordenado, nos n�veis local e descentralizado, com as pol�ticas de desenvolvimento econ�mico, infra-estrutura b�sica (eletricidade, telefonia, rede vi�ria, etc.) e de promo��o da organiza��o aut�noma dos povos ind�genas:

� Incorpora��o das condi��es m�nimas de infra-estructura b�sica nas �reas rurais mais postergadas e melhoramento da existente em toda a �rea de assentamento ind�gena, de forma a facilitar o acesso de uma massa cr�tica de novos usu�rios em n�mero que pode chegar a ser significativo para as cifras nacionais, sobretudo em pa�ses como a Guatemala, o Equador, a Bol�via e o Peru.

� Diminui��o do analfabetismo e incremento do n�vel educativo da popula��o origin�ria em seu conjunto, e particularmente das mulheres.

� Promo��o de atitudes favor�veis � incorpora��o das TICs, tanto entre os dirigentes quanto no conjunto da popula��o.

� �nfase nas transforma��es na educa��o b�sica de meninas e meninos: incorpora��o de programas de educa��o bil�ng�e e intercultural (com presen�a de agentes, modalidades de transmiss�o do conhecimento e conte�dos culturais pr�prios) e, particularmente, impulso ao tr�nsito, a partir do paradigma pedag�gico tradicional, para as propostas da pedagogia cr�tica, a fim de promover na popula��o infantil comportamentos proativos/positivos e o desenvolvimento de marcos cognitivos conducentes ao usufruto da racionalidade e potencialidade das TICs.

� Impulso da modalidade de acesso compartilhado �s TICs por meio de telecentros em �reas rurais e peri-urbanas.

� Reconhecimento oficial, normaliza��o e divulga��o da escrita das l�nguas ind�genas, a fim de abrir espa�os inform�ticos interculturais onde as manifesta��es de cada povo encontrem express�o em seu pr�prio c�digo ling��stico, propiciando a produ��o de um �mbito de aplica��o n�o tradicional para tais l�nguas.

� Identifica��o e capacita��o de organiza��es ind�genas de base, rurais e urbanas, que se encontrem em condi��es de auto-gestionar empreendimentos comunit�rios de inclus�o inform�tica.

� Auto-identifica��o de pr�ticas locais que se potenciem com o uso das TICs e, ao mesmo tempo, promovam sua incorpora��o.

� Est�mulo da autogest�o no manejo das novas tecnologias e na produ��o de conte�dos; fomento do processo de apropria��o e capacita��o dos usu�rios ind�genas.

� Habilita��o de inst�ncias de controle social, local e comunit�rio, que garantam a efetividade dos mecanismos de coordena��o, controlem a administra��o dos recursos inform�ticos e supervisionem sua distribui��o equ�itativa entre a comunidade.

� Abertura de fontes de trabalho com base nos novos recursos e habilidades dispon�veis nas comunidades.

� Desenvolvimento de linhas de pesquisa a respeito das formas de apropria��o, acesso, modalidades de uso, objetivos e proje��o da participa��o atual na sociedade inform�tica dos grupos e indiv�duos ind�genas, focalizando os estudos em profundidade de casos paradigm�ticos e representativos. O design de tais pequisas participativas orientar� a explora��o intra-comunit�ria para decidir a forma em que as TIC's ser�o incorporadas, a partir da premissa de que as comunidades ind�genas possam decidir utiliz�-las de maneira diferente que outros grupos dentro das sociedades nacionais.

 

 



[1] Comiss�o Econ�mica para a Am�rica Latina e o Caribe das Na��es Unidas (CEPAL). A CEPAL � uma das cinco comiss�es regionais das Na��es Unidas e sua sede est� em Santiago do Chile. Foi fundada para contribuir para o desenvolvimento econ�mico da Am�rica Latina, coordenar as a��es orientadas � sua promo��o e refor�ar as rela��es econ�micas dos pa�ses entre si e com as demais na��es do mundo. Posteriormente, sua tarefa se ampliou aos pa�ses do Caribe e foi incorporado o objetivo de promover o desenvolvimento social. A CEPAL possui duas sedes sub-regionais, uma para a sub-regi�o da Am�rica Central, localizada em M�xico, DF. e a outra para a sub-regi�o do Caribe, situada em Port of Spain, que foram estabelecidas em junho de 1951 e em dezembro de 1966, respectivamente. Tem, ainda, escrit�rios nacionais em Buenos Aires, Bras�lia, Montevid�u e Bogot�, e um escrit�rio de enlace em Washington, DC.

[2] O ICA � uma organiza��o hemisf�rica que promove a implementa��o de aplica��es inovadoras de tecnologias da informa��o e a comunica��o (TICs) para o desenvolvimento. O Instituto se esfor�a para conectar as Am�ricas por meio do co-financiamento de projetos, participando ativamente na forma��o de parcerias e apoiando a cria��o de conhecimentos e capacita��o. A vis�o do ICA � a de que, ao se conectar os cidad�os das Am�ricas, se estar� fortalecendo a democracia, gerando prosperidade e ajudando a tornar realidade o potencial humano da regi�o. O ICA foi criado como uma das contribui��es do Canad� � C�pula das Am�ricas de 2001, recebendo fundos iniciais para trabalhar em cima do sucesso e da experi�ncia da Estrat�gia "Conectando os Canadenses" (Connecting Canadians Strategy) e dos programas de desenvolvimento internacional e de TICs do Canad�. O ICA mant�m escrit�rios em Ottawa e em Montevid�u; e est� sendo incubado atualmente no Centro Internacional de Pesquisas para o Desenvolvimento (IDRC) http://www.icamericas.net